“Coloco a reforma administrativa em primeiro lugar, e a tributária em segundo; reduzir burocracia e impostos”, afirma deputado Paulo Caleffi
Paulo Vicente Caleffi (PSD) tomou posse no dia 4 de maio como deputado federal. Aos 72 anos, o empresário de setor de logística e transportes assumiu uma cadeira na Câmara dos Deputados no lugar do colega de partido Danrlei de Deus, que se licenciou do cargo para assumir a Secretaria de Esportes e Lazer do Rio Grande do Sul.
Natural de Bento Gonçalves, Caleffi é o primeiro político oriundo da “Capital do Vinho” a assumir uma vaga no Congresso desde 1991, quando Darci Pozza e Paulo Mincarone deixaram seus mandatos de deputados federais. Em sua cidade natal, Caleffi ficou segundo lugar nas eleições para a prefeitura municipal em 2020, uma disputa que ainda está sendo travada na Justiça Eleitoral, devido a um processo para cassação da chapa vencedora.
Ex-presidente da Federação das Empresas de Logística e Transporte de Cargas no Rio Grande do Sul (Fetransul), Caleffi critica a criação da tabela do frete para o transporte RODOVIáRIO, medida tomada pelo governo de Michel Temer (MDB) após a greve dos caminhoneiros de 2018. Segundo o deputado, a tabela não soluciona os problemas da remuneração da categoria. “Não vai ser um canetaço que vai resolver as questões da lei de mercado”, destaca.
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Caleffi fala sobre as ações governamentais nas áreas de transportes e suas expectativas para a aprovação de reformas na Câmara dos Deputados, entre outros temas.
Jornal do Comércio – Apesar da grande importância econômica de Bento Gonçalves para o Rio Grande do Sul, fazia 30 anos que a cidade não tinha um deputado federal. Pode-se dizer que a cidade tem força econômica, mas não POLíTICA?
Caleffi – Não diria que a força política de Bento Gonçalves é fraca, mas seus políticos não conseguiram se destacar. Mesmo eu, não fui eleito deputado, fui eleito suplente de deputado. Conseguimos juntar 19 mil votos de Bento mais 12 mil votos da região para eu ficar na primeira suplência do PSD. É muito difícil, principalmente na nossa conjuntura eleitoral, para uma pessoa que não faz parte da política conseguir se eleger, 40 dias para fazer campanha é muito pouco tempo. Temos agora um deputado que nunca fui uma pessoa que ocupou um cargo político, vai direto de empresário para deputado federal.
JC – O senhor tem uma atuação de muitos anos no setor de transporte e logística. Deve dar ênfase a esses temas no seu mandato?
Caleffi – Meu conhecimento sempre foi na área de gestão. Trabalhei em uma empresa de transportes, presidi sindicato e federação de empresas rodoviárias e fui secretário-geral durante 18 anos da Câmara Interamericana de Transportes, que abrange todos os modais, aéreo, marítimo, pluvial e ferroviário. Tenho mais conhecimento nessa área, mas fui professor de economia regional urbana, de análise microeconômica; durante 14 anos lecionei em universidade. Tenho formação como advogado, economista e trabalhei no setor privado, em empresas do ramo agropecuário, construção, estaleiro naval… Meu último cargo foi em tecnologia avançada, em uma empresa de dirigíveis para transporte de carga. Então, pela minha experiência, vou ocupar uma cadeira onde não serão apenas os setores de transporte e logística unicamente privilegiados.
JC – Como o senhor avalia o governo Jair Bolsonaro?
Caleffi – Eu preciso que o Bolsonaro dê certo, que o governo dê certo, porque é meu país, é o barco que nós estamos. Nós elegemos ele, por que eu vou trabalhar para que não dê certo? Fosse quem fosse que tivesse lá, eu faria de tudo para ajudar, porque depois de eleito, é o governante, tem que dar certo. Daí dizem, “ah, mas ele errou”, mas quem não errou? Nós temos que pensar em fazer com que erre o mínimo possível, vamos medi-lo pelos acertos muito mais do que pelos erros. Então, se tiver que brigar para que o Bolsonaro dê certo, eu brigo, eu preciso que esse país saia do estágio que vinha, para um novo patamar, o que foi prometido na campanha. Eu quero que esse novo estágio para nossa sociedade aconteça.
JC – Na última eleição nacional, em 2018, um dos grandes temas relacionados à área dos transportes eram as demandas dos caminhoneiros, que haviam feito uma grande greve naquele ano, afetando economicamente todo o País. Uma das soluções dadas na época foi o tabelamento do frete, para reduzir perdas do segmento. Como o senhor julga essa política? Ela tem resolvido as questões do setor?
Caleffi – Ela não tem resolvido. O Brasil ficou paralisado naqueles dias, e muitas coisas foram feitas erradas naquela época para contornar os problemas do segmento. Uma foi a tabela de frete, que é uma solução inconstitucional, que até agora o Supremo Tribunal Federal (STF) ainda não tomou uma posição a respeito por questões políticas. Mas a Constituição garante a liberdade econômica. Tanto as tabelas de frete não foram boas que o próprio caminhoneiro passou a encontrar muito mais concorrência do que tinha, em função de que as empresas de carga própria compraram milhares de caminhões para fazer o serviço. Com isso, diminuiu a possibilidade do uso dos caminhões de autônomos. Eu sempre disse que a tabela do frete foi um tiro no pé. Ela não foi uma solução, foi implantada apenas para acalmar os motoristas, mas tenho certeza que, em geral, não foi boa. Ela não espelha uma realidade, é uma tabela técnica que não consegue ser aplicada no mercado, tira competitividade do autônomo assim como tira a competitividade do País. Não vai ser um canetaço que vai resolver as questões da lei de mercado. No passado foram feitos grandes financiamentos para que todo mundo tivesse caminhão, e criamos uma bolha, a hora que ela estourou ocorreu a greve, mas a crise era fruto de um excesso de ofertas. Aí, com a caneta tentaram resolver de uma forma que não mostra a realidade dos negócios.
JC – Um dos pleitos dos caminhoneiros, em 2018, era a redução do preço do diesel, que na véspera da greve atingia valores médios que hoje, atualizados pela inflação, ficariam em torno de R$ 4,10 o litro. Mas a média nacional está acima desse patamar. Por que não ocorre hoje um movimento similar da categoria? O caminhoneiro perdeu força?
Caleffi – O caminhoneiro tem muita força, mas na época houve também um apoio popular. A população aderiu ao movimento e usou a paralisação dos caminhoneiros para atingir um objetivo, que era o repúdio ao governo. O problema é que a solução, que foi a tabela de frete, não foi suficiente. Mas a política de combustíveis do País precisa ser revista, considero errada a forma como é feita. Como o Paraguai consegue vender combustível com petróleo brasileiro pela metade do preço? A gente precisa analisar um pouco melhor essa questão da política de combustíveis, até para evitar que os caminhoneiros se rebelem mais uma vez.
JC – Recentemente, o governo federal lançou o programa Gigantes do Asfalto, com uma série de benefícios voltados para os caminhoneiros. Como avalia as medidas anunciadas?
Caleffi – Esse instrumento cria eixos na infraestrutura, serviços e incentivo à qualidade de vida dos profissionais da área. Vieram algumas medidas especificas de afago aos caminhoneiros, mas necessárias, como novos limites de tolerância na pesagem dos caminhões. Já a criação do Documento de Transporte Eletrônico (DTE), que seria reduzir burocracia, unificando documentos atualmente exigidos, assim como a antecipação dos recebíveis para motoristas autônomos, precisam de uma análise mais profunda, pois muda muito o que existia por parte das empresas, precisariam de ajustes para evitar mais gastos. O que me pareceu é que as medidas foram feitas sem consulta mais profunda com quem conhece o setor. Existem alguns pseudolíderes da categoria que ameaçam greves mas não têm representatividade real. As demandas deles merecem atenção, mas não a ponto de fazer alterações profundas no sistema de transporte nacional. Mas preciso que o governo acerte, e vou contribuir para que isso que foi decidido seja aplicado.
JC – O presidente do PSD, Gilberto Kassab, vem dando manifestações defendendo a candidatura própria do partido em 2022. O senhor acredita que o PSD tem condições para lançar uma candidatura própria?
Caleffi – No primeiro turno, tem. Pelo que senti do presidente Kassab, devemos ter um candidato próprio. Mas é uma posição particular, eu não falo em nome do partido.
JC – O Congresso Nacional tem agora como principal desafio votar as questões das reformas administrativa e tributaria. Como o senhor se posiciona em relação a esses temas?
Caleffi – Acredito que as reformas administrativa e tributária só vão acontecer quando existir uma reforma política, porque os entraves nascem exatamente desta questão. O que sinto no Congresso é uma grande disposição dos parlamentares em resolver esses assuntos, haja vista que há poucos dias foi aprovada uma reforma interna de regimento, para reduzir mecanismos que atrasam ou impedem a votação de projetos. Isso significa que o Congresso Nacional está preocupado em evitar obstruções, para que possamos decidir essas três reformas. Há, por parte dos parlamentares, muita disposição, muito interesse, com exceção de alguns, é lógico, para que esse país dê certo. Em relação às prioridades, lembro que existe um princípio da economia doméstica, que para fazer uma família estar bem é preciso ou alguém ganhar mais ou todos gastarem menos. Sou contra qualquer tributo novo ou aumento de tributo. Então, como prioridades, coloco a reforma administrativa em primeiro lugar, e a tributária e fiscal em segundo lugar. Temos que reduzir a burocracia e os impostos, e não aumentá-los.
JC – O presidente da Câmara, deputado federal Arthur Lira (PP-AL), recentemente criou uma comissão para analisar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do Voto Impresso, uma medida defendida pelo presidente Bolsonaro como necessária para evitar fraudes eleitorais. Qual é a sua opinião em relação a esse tema?
Caleffi – Sou a favor de tudo aquilo que leve a uma estabilidade do País e a uma tranquilidade do eleitor. Nós não podemos ficar com a dúvida, se alguma proposta for para tirar essa dúvida, sou favorável. Então, defendo o voto impresso paralelo para fim de comprovação.
JC – O senhor concorreu a prefeito de Bento Gonçalves em 2020, ficando em segundo lugar em uma eleição que depois foi marcada pela disputa judicial em relação à possível cassação da candidatura da coligação vencedora. O senhor acredita que a Justiça Eleitoral ainda pode dar uma decisão favorável ao senhor?
Caleffi – Os diplomas da chapa vencedora foram cassados, mas, como houve apelação, a decisão está sub judice. A Justiça Eleitoral é que deve dar o pronunciamento final. Mas o Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul já definiu que haverá novas eleições no município de Putinga em julho, o que é um bom sinal.
JC – Pretende disputar a vaga da Câmara dos Deputados novamente?
Caleffi – Hoje, se precisar para ajudar a arrumar o País, eu sou candidato até a síndico do meu prédio (risos).
Perfil Natural de Bento Gonçalves, Paulo Vicente Caleffi, nasceu em 17 de agosto de 1948. É graduado em Direito e em Economia e pós-graduado em Marketing e em Pesquisa e Ensino pela Universidade de Caxias do Sul; pós-graduado em Logística (2007) e em Inovação e Competitividade (2009), pela Universidade de Miami (USA). Em 1985, liderou os empresários que fundaram o Sindicato das Empresas de Transportes de Cargas de Bento Gonçalves (Sindibento) e foi presidente da entidade por 12 anos. Como presidente do Sindibento participou da criação da Federação das Empresas de Transportes de Cargas no Estado do Rio Grande do Sul (Fetransul), da qual também foi presidente de 2000 a 2019. Caleffi é diretor da Transportes Bertolini Ltda desde 1987. Em 1994 concorreu a deputado federal pelo PPR, hoje PP, mas não foi eleito. Voltou a disputar em 2018, pelo PSD, ficando como primeiro suplente. Em 2020, concorreu a prefeito de Bento Gonçalves. Ficou em segundo lugar, atrás do eleito Diogo Siqueira (PSDB). A eleição foi contestada na Justiça, que na primeira instância chegou a cassar a candidatura vencedora, mas a decisão foi suspensa. O processo será julgado pelo Tribunal Regional Eleitoral. No início do mês, Caleffi assumiu vaga na Câmara dos Deputados no lugar de Danrlei de Deus (PSD), que foi empossado secretário da gestão Eduardo Leite (PSDB).