Os estudos realizados por William Summerhill, pesquisador e membro da universidade da Califórnia em Los Angeles, provam que a realidade ferroviária do Brasil foi diferente no final do século XIX e início do século XX. Os estudos realizados por William Summerhill, pesquisador e membro da universidade da Califórnia em Los Angeles, provam que a realidade ferroviária do Brasil foi diferente no final do século XIX e início do século XX.
No livro “As ferrovias no crescimento da economia brasileira de 1854 – 1913”, o autor apresenta dados econômicos que demonstram o excelente retorno que o setor trazia ao país e aos investidores.
Segundo os cálculos de Summerhill, as vias férreas reduziram o custo dos transportes e incrementaram o PIB brasileiro em 18%, gerando de 1 a 2 milhões de mil réis ao país (moeda vigente na época).
O limite superior apresentado pela pesquisa aponta que o PIB brasileiro teve de 18% a 38% de sua composição por recursos gerados pelas ferrovias. O limite inferior gira entre 7% e 10%, o que, segundo o americano, é um valor alto.
“A disposição das linhas férreas no Brasil representaram entre 10% e 60% no aumento de produtividade do país. A taxa de retorno social para a economia ficou entre 18% e 23%. É difícil encontrar algo neste sentido hoje em dia. O país não mostrou avanços durante o início do século XIX, mesmo com muitos recursos naturais. A economia passou a ser notada após a utilização das ferrovias”, analisou o autor no lançamento da versão da obra em português, realizada durante o último dia 7 no Insper, em São Paulo.
Para fazer o cálculo, Summerhill se baseou nos valores cobrados pelas operadoras em 1913 para viagens de passageiros e de cargas. “Na época, a tecnologia deste modal foi extremamente eficiente diante de alternativas de transporte. Apesar de o Brasil ter muitos rios, o desenvolvimento econômico não foi eficiente neste sentido. Não eram concorrentes no contexto, mas sim complementares”, analisou.
William Summerhill relata que o investimento estrangeiro, principalmente inglês, foi fundamental para o crescimento da malha ferroviária no período. Para atrair capital, o governo brasileiro assumia a responsabilidade de arcar com juros anuais de 7%.
Caso o valor ultrapassasse 12%, o governo recebia dos investidores. “A taxa de retorno sem subsídios era altíssima, em torno de 1,8 milhões de mil réis. Os juros, que o governo assumiu como ‘taxa de garantia’, servia para dar mais confiança, gerando maiores investimentos. Isso aumentou ainda mais os ganhos das operadoras, que lucravam de forma satisfatória. Outros países, como EUA e Índia, também faziam isso na época”.
Entre as principais iniciativas brasileiras, foram citadas as Estradas de Ferro Dom Pedro II, Companha Paulista, Companhia Mogiana, Companhia Sorocabana e Estradas de Ferro São Paulo – Rio de Janeiro.
“Quando o Brasil prometia uma garantia de juros, eles tinham credibilidade no mercado. Era um ambiente extremamente favorável para o investimento em infraestrutura”.
Segundo a pesquisa, eram 23 mil quilômetros de vias em operação no ano de 1913, mais do que o dobro dos 10 mil quilômetros atualmente em operação.
Summerhill também apontou uma falha na continuidade do trabalho com as ferrovias, que décadas mais tarde tiveram clara descontinuidade por conta dos investimentos em rodovias. “Criou-se, ao longo das décadas, linhas férreas menores, que não tinham produção suficiente para justificar investimentos. De 45 ferrovias existentes no Brasil em 1913, 15 geraram retorno econômico. Transferindo os capitais dessas linhas menores para outras empresas ou outros investimentos, o PIB poderia ter crescido em mais 2% além do valor registrado”.
Discussão
Antes da apresentação de William Summerhill, a Insper promoveu um debate sobre os atuais problemas no setor ferroviário brasileiro. A falta de planejamento, a necessidade de projetos qualificados e as renovações antecipadas das concessões foram os tópicos citados.
O holandês Paul Procee, membro do Banco Mundial em Brasília para dirigir o portfólio de infraestrutura no Brasil, aponta que as questões de financiamento não são o maior problema.
“Existem empresas e investidores interessados. Mas o maior gargalo é o planejamento estratégico a longo prazo. Não se sabe qual será o projeto do Brasil para a próxima década. Ninguém sabe qual é o pensamento estratégico. Não há transparência no diálogo, principalmente quando falamos nas concessões.”
Para o coordenador de Transportes, Recursos Naturais e Saneamento da Secretaria de Promoção da produtividade e Advocacia da Concorrência (Seprac) do Ministério da Fazenda, Fábio Coelho Barbosa, é preciso ter muita atenção ao renovar as concessões vigentes.
“O modelo pensado na década de 90 não foi feito para resolver problemas, mas sim estancar o déficit da Rede Ferroviária. Tomaram-se decisões erradas e hoje temos que encarar as dificuldades para evoluir. Novos equívocos podem trazer consequências para os próximos 40 anos. Precisamos reparar contratos falhos, pensando nas novas necessidades. Mas é difícil firmar novos contratos baseados em investimentos se você não tem capacidade de sustentar a vigência do atual contrato”.
Júlio Marcelo de Oliveira, procurador no Ministério Público de Contas da União junto ao TCU desde 2004, afirma que o investimento na elaboração de projetos também é fundamental para o crescimento do setor. “Não adianta fazer uma coisa que o mercado não acredita que vá dar certo. É melhor investir dois ou três anos em estudos e projetos para apresentar planos totalmente quantificados e quantificados.”
Em relação à renovação dos contratos das concessões de carga, o procurador disse que é muito importante um modelo consistente, onde se tenha clareza e transparência sobre questões como direito de passagem. “Não podemos fazer as coisas num ritmo acelerado pelo calendário eleitoral. O compromisso deve ser com a bem feitoria, e não com a pressa.”