O bom momento do agronegócio brasileiro coincide com a instalação de uma guerra comercial entre China e EUA que impactará toda a dinâmica do mercado internacional de soja, que inicia o novo ano-safra em setembro. Na cafeicultura, o Brasil também comemora uma colheita favorável e produtores, exportadores e instituições financeiras intensificam o uso de instrumentos que proporcionam lucratividade e proteção contra oscilações de preços. E todos os agentes do agronegócio enfrentam a volatilidade cambial causada pela incerteza eleitoral e fiscal e pelo aperto monetário nos EUA.
Este foi o ambiente analisado durante a terceira edição da conferência Visão Agri, realizada em 7 de agosto, em São Paulo, no escritório da Bloomberg, em parceria com a ED&F Man Capital Markets.
“A guerra comercial não é mais expectativa, é realidade”, disse Sol Arcidiácono, responsável pelas operações da ED&F Man na Argentina. Segundo ela, o mercado de grãos teve um semestre para assimilar a nova realidade desde que o presidente americano, Donald Trump, fez as primeiras ameaças e, neste ciclo comercial que se inicia no mês que vem, a China importará uma parcela ainda maior da safra de soja do Brasil, chegando a mais de três quartos do total. Enquanto isso, a Argentina comprará mais soja dos EUA e Paraguai para processamento e exportação, com vistas ao mercado chinês. Para a especialista, com a tensão entre China e EUA, é possível que até o Brasil passe a comprar soja americana.
Importações de soja da China
Durante a palestra, Sol Arcidiácono ressaltou a expansão do complexo de esmagamento de oleaginosas em Rosário e o avanço logístico do Brasil no escoamento de uma gigantesca safra de grãos, mesmo com a greve dos caminhoneiros. Segundo ela, essa infraestrutura deu suporte aos preços. “Foi conseguido com eficiência logística, produtiva e comercial do Brasil.”
No mercado de café, onde a atual safra brasileira é a de melhor qualidade em anos, chama atenção o aumento da sofisticação da cadeia de negociação, com presença maior de instituições financeiras e instrumentos que permitem ao produtor aproveitar momentos em que as condições estão atraentes e não ficar restrito aos períodos em que precisa vender.
“A venda no mercado spot vai diminuir ainda mais e migrar para a ferramenta de negociação antecipada porque possibilita a venda por oportunidade”, disse Tiago Ferreira, responsável pela operação de café da EDF. Ele espera ampliação da participação de seguradoras e fundos de investimento no mercado, não só com posições especulativas, mas oferecendo capacidade de financiamento, propondo fontes alternativas de crédito, conexão com o mercado internacional e agregando valor para o produtor.
Paralelamente, a maior presença de fundos e outras instituições financeiras no mercado de café também exacerba as oscilações dos preços, exigindo que o produtor se mantenha informado e atuante para aproveitar esses movimentos, explicou Ferreira.
O pano de fundo de depreciação cambial, corrida eleitoral e o ritmo consistentemente aquém das expectativas na atividade econômica também foi tema da conferência.
Para o analista sênior de pesquisa de mercado da ED&F Man, João Santucci, a economia dos EUA, com pleno emprego, retirada de estímulos monetários e crescimento da produção industrial, dá suporte ao dólar, que se valorizou não apenas em relação ao real, mas contra a maioria das moedas de países emergentes. No entanto, a moeda brasileira também vem sofrendo influência do quadro eleitoral.
A resposta do mercado define o câmbio
Santucci afirmou que, do ponto de vista dos investidores, as pesquisas de intenção de voto preocupam por refletirem maior aceitação de discursos populistas de esquerda e direita, que atrapalhariam a implementação de reformas essenciais para conter a alta da dívida pública.
Por outro lado, as alianças partidárias acertadas recentemente favorecem o chamado centro, porque o horário eleitoral gratuito na televisão é especialmente importante para a parcela do eleitorado que ainda não escolheu candidato. “A guerra agora é para conquistar indecisos”, disse Santucci, apontando que, em 2014, 49% decidiram o voto durante o período oficial de campanha e 13% no dia da eleição.