Considerado um dos países mais fechados do mundo, o Brasil está prestes a passar por um novo ciclo de redução de tarifas de importação, visto somente no início dos anos 1990, durante o governo Collor. A forma e a velocidade em que esse processo vai acontecer ainda são desconhecidas, mas estimativas conservadoras da equipe de transição do presidente eleito, Jair Bolsonaro, projetam que, 20 anos depois de concluída a abertura comercial, haverá uma queda de até 16% nos preços domésticos.
As exportações, por sua vez, vão crescer, mas cerca de 3 milhões de trabalhadores terão de ser requalificados para buscar oportunidades em outras áreas. Segundo estudo produzido pela Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República, encaminhado para análise pela equipe de transição, esse contingente de trabalhadores estaria concentrado, principalmente, nos segmentos de couro, têxteis, vestuário, automóveis e bens de capital.
A tendência é que essas pessoas migrem para a área de serviços, ou caiam na informalidade. Os autores da pesquisas recomendam a adoção de políticas públicas, como a oferta de programas de qualificação profissional, para realocar os desempregados. Apesar dessa projeção, o estudo indica que o efeito final sobre o emprego formal será positivo.
Em 85% de um total de 558 microrregiões (conjunto de cidades de médio porte ou polos habitacionais) pesquisadas, o resultado se concentraria num intervalo de -0,25% a +0,25% de variação no emprego formal. Mesmo os casos mais extremos variam entre -2% e +2% da força de trabalho. Queda média de 5% no preço.
O estudo estima uma queda média de 5% nos preços de produtos de 57 setores econômicos em função do aumento da concorrência por causa das importações. Os cálculos foram feitos levando em conta informações como produção, emprego, salário, preços, importação e exportação. Em setores que hoje são muito protegidos, como automóveis, maquinários, couro, têxteis e vestuários, a redução seria ainda mais expressiva: de 6% e 16%. Os autores do estudo defendem a liberalização comercial.
Ressaltam que uma redução nas tarifas médias brasileiras e uma maior abertura ao comércio internacional tenderiam a aumentar não só as importações brasileiras, mas também as exportações e o grau de eficiência da economia. Citam como exemplos bem-sucedidos Chile, Indonésia, Coreia do Sul e Taiwan. Os sinais emitidos por fontes da equipe Bolsonaro é que esse processo deve ser feito gradualmente ao longo do mandato.
O agronegócio, com algumas exceções, como vinhos, leite e derivados, já é bastante aberto nas trocas comerciais e, por isso, não deve ser tão afetado pela abertura. Por outro lado, quanto mais longa a cadeia produtiva e mais elevada a tarifa de importação, maior será o impacto. Hoje, os produtos industriais importados no Brasil são taxados em até 35%, alíquota máxima permitida pela Organização Mundial do Comércio (OMC). – O setor industrial teria dificuldades para resistir a uma abertura comercial acelerada – afirma Welber Barral, consultor internacional e secretário de Comércio Exterior no governo Lula.
Uma grande preocupação, hoje, é como se dará a queda das alíquotas de importação. A avaliação do setor industrial é que ela deveria ser feita com uma negociação na qual o Brasil possa obter vantagens em troca da liberalização de seu mercado. Além disso, o novo governo deveria adotar e propor medidas ao Legislativo para reduzir o custo de produção nacional, estimado em 30%, devido a fatores como juros, alta carga tributária, câmbio e transportes. – O país não está preparado para uma abertura comercial. Primeiro, é preciso reduzir o custo Brasil, para que possamos ter condições de igualdade com nossos concorrentes. Senão, estaremos beneficiando os fornecedores estrangeiros – destaca José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).
O presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), Fernando Pimentel, por sua vez, garante que o setor não teme esse novo ciclo. No entanto, defende que a abertura não pode ser feita de forma unilateral: – O mundo é feito de trocas, e é através dos acordos negociados que se obtêm concessões – diz dele.
Para Thomaz Zanotto, diretor titular de relações internacionais da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), é preciso levar em conta que o país passou por uma grande crise econômica, cuja consequência foi um estoque de 12,5 milhões de desempregados: – Todos queremos um país mais aberto e mais integrado ao mundo.
O novo governo deve adotar políticas para haver mais negócios no Brasil, e a abertura comercial deve ser paulatina, levando em conta setores mais sensíveis. Há todo um conjunto de coisas que precisam ser feitas com bastante cautela. O problema não é o remédio, que está correto, mas sim a dosagem e a rapidez.