Quem, assim como eu, recebeu com certo desdém as primeiras confirmações de casos brasileiros do novo coronavírus, em fevereiro de 2020, não poderia imaginar que oito meses depois ainda estaríamos tentando definir o tal de “novo normal”.
A mídia trouxe com força total a “histeria coletiva” na qual estavam a China e a Itália, e acelerou as decisões de governo que nos colocariam em isolamento antes do fim de março. Em contrapartida, quase ninguém imaginou que falar de lockdown, isolamento vertical, #ficaemcasa, que ações necessárias para salvar vidas acabam tendo como efeito colateral a desaceleração e, em muitos casos, a paralisação de alguns setores da economia.
O transporte RODOVIáRIO de cargas é atividade estratégica e fundamental para o funcionamento da economia e o abastecimento da sociedade, inclusive, por atuar como agente intermediário com os demais modais. No entanto, interpretações distintas sobre a classificação de produtos e serviços essenciais induziram às restrições de circulação e criaram percalços operacionais, descontinuando atividades de apoio ao transporte (em especial, os pontos de parada dos caminhoneiros nas estradas). Mas de uma forma ou de outra, perseveramos, nos ajudamos, contamos com apoio de entidades do setor (destaque especial ao Sest Senat), e cumprimos nossa missão: o transporte não pode parar (e não parou)!
Dentre os segmentos menos afetados pela pandemia, como já se imaginava, ficaram os de alimentação e saúde. Aqueles, no entanto, ligados aos bens de consumo duráveis ficaram na outra ponta, e foram severamente prejudicados pela crise.
Para manter as operações em funcionamento e prezar pela segurança de funcionários, parceiros, fornecedores e clientes, todas empresas precisaram fazer mudanças em suas formas de trabalho, sejam elas decorrentes das diversas Medidas Provisórias lançadas pelo governo federal, ou aquelas definidas pelas suas diretrizes internas (ou comitês de crise).
Mesmo com a adoção do teletrabalho, antecipação de férias, uso de banco de horas, suspensão temporária de obrigações (como o recolhimento do FGTS e de alguns outros tributos federais), suspensão temporária de contrato de trabalho, redução de jornada e salário, dados da última pesquisa lançada em setembro/2020 pela Confederação Nacional do Transporte (CNT), revelaram que:
40,6% promoveu redução em seu quadro de funcionários (apesar de mais da metade deles estar com grande perspectiva de readmissão de parte ou da totalidade deles ate o final do ano);
67,4% tiveram prejuízos durante a pandemia, sendo que 36,2% alegou ter tido a capacidade de pagamento muito comprometida (folha de pagamento, financiamentos, tributos, fornecedores e aluguel, entre outros);
51,8% das empresas de transporte solicitaram aos bancos algum tipo de financiamento, sendo que quase dois terços delas tiveram a sua solicitação negada.
Passada a crise, muitas empresas certamente irão reformular seu negócio com foco na digitalização de processos. A barreira do medo das compras on-line, que ainda existia, foi quebrada e não tem volta. O aumento desse tipo de compra provocado em tempos de isolamento social deverá fortalecer ainda mais o varejo digital e isso também trará reflexos no setor logístico. A mudança de paradigma está aí.
Surgiram startups que utilizam o trabalho de pessoas físicas para fazer a distribuição, dada pulverização das entregas. Ampliou-se a conexão das transportadoras e motoristas à plataformas de marketing place específicas para a logística.
A meta é de pensamento flexível, visando sair da esfera da micro gestao do negócio, e enxergar as tendências que virão. É essencial que haja um esforço coletivo em prol da desburocratização do setor. O Airbnb “aconteceu” pro setor hoteleiro, o Uber “atrapalhou” os taxistas, e agora chegou a vez do transporte se reinventar. É preciso pensar fora da caixa!
No setor de transporte de cargas e logística, crise e oportunidades de negócios caminham juntas. A capacidade em superar obstáculos é inerente ao segmento. É fundamental fazer uma boa análise de riscos, considerando aspectos do próprio negócio (e do mercado global).
As empresas que souberem aproveitar o momento para rever suas estratégias de transformação digital, adotando ações para reestruturarem os planos de continuidade dos negócios diante do cenário de imprevisibilidade, com certeza estarão à frente das demais.
Por: Carolina Resuto