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As tarifas de pedágio em estradas federais privatizadas estão tendo uma onda recente de queda por causa do atraso das concessionárias em entregar grandes obras exigidas por contrato.
Nas últimas três semanas, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) chegou a determinar reduções de dois dígitos no valor cobrado dos usuários, como na Rodovia do Aço (RJ) e na Eco 101 (ES). As tarifas caíram quase 12%. No mês passado, a Autopista Litoral Sul (operadora do corredor Curitiba-Florianópolis) teve reajuste zero. Em agosto, os pedágios da Via Bahia encolheram até 10,3%. Outras concessionárias passaram pelo mesmo processo, mas conseguiram liminares judiciais para evitar perda de receitas.
Esse movimento é consequência direta do descumprimento contratual pelas empresas. Um pente-fino do Tribunal de Contas da União (TCU) detectou R$ 20 bilhões em intervenções obrigatórias que deixaram de ser feitas.
A lista de obras jamais executadas abrange a construção dos contornos rodoviários de Goiânia e de Florianópolis, a nova subida da serra de Petrópolis (RJ), a ampliação de capacidade da BR-153 no interior de São Paulo, as duplicações da BR-163 em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.
“As concessões rodoviárias têm sido notadamente ineficazes na realização das principais obras almejadas pela União quando da licitação”, afirma um relatório da Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura Rodoviária e de Aviação Civil do TCU. “Com isso, mesmo após longos anos de contrato, obras relevantes são reiteradamente proteladas pelo ente privado, colocando em xeque o modelo de concessões como uma alternativa segura para a realização dos investimentos”, diz o parecer.
Até mesmo trechos campeões em acidentes graves ficaram sem as melhorias prometidas. Nenhum outro ponto das rodovias federais teve tantas mortes em 2017, conforme estudo da Confederação Nacional dos Transportes (CNT), quanto dez quilômetros da BR-101 administrados pela Ecorodovias no município de Guarapari (ES). Foram 21 vítimas fatais.
Esse trecho, ainda em pista simples, deveria ter sido duplicado até 10 de maio de 2019 – fim do sexto ano de concessão. A Eco 101 diz que as obras finalmente começam agora em novembro e atribui o atraso a dificuldades com o licenciamento ambiental.
Na lista dos dez trechos mais perigosos da malha federal, segundo a CNT, estão também 20 quilômetros da BR-040 situados em Luziânia (GO). A rodovia está nas mãos da Invepar. Os auditores do TCU verificaram que, nos termos originais do contrato, faixas adicionais deveriam ter sido implantadas no trecho até o fim do segundo ano de concessão (entre 2016 e 2017), e vias marginais, até o sexto ano (entre 2020 e 2021). Nada foi iniciado até hoje.
O acúmulo de obras não realizadas começa a ter efeitos visíveis nas revisões ordinárias que são feitas anualmente pela ANTT. O atraso nas obrigações contratuais se reverte em compensação na tarifa de pedágio. Em agosto, por exemplo, a antiga MGO (responsável pela BR-050 e que vendeu o controle à Ecorodovias) teria tido reajuste de 3,89% – correspondente ao IPCA dos 12 meses anteriores. Por causa dos atrasos, acabou havendo redução de 5,96%.
As determinações da ANTT, entretanto, nem sempre chegam aos usuários. De acordo com a agência reguladora, seis das 20 concessionárias federais detêm liminares que impedem redução de tarifas ou aplicação de penalidades. As decisões na Justiça protegem empresas que operam rodovias leiloadas na 3ª etapa de concessões federais e tiveram contratos assinados no governo da ex-presidente Dilma Rousseff.
São os casos de Concebra (controlada pela Triunfo), Via 040 (Invepar), Rota do Oeste (Odebrecht) e MSVia (CCR). Todas elas assumiram o compromisso de duplicar integralmente suas pistas no prazo máximo de cinco anos, mas não conseguiram honrá-lo.
A Concer (Rio-Juiz de Fora), que faz parte do primeiro lote de concessões (governo Fernando Henrique Cardoso) e teve 12,9% de redução de tarifa determinada pela ANTT, foi aos tribunais e obteve liminar no mês passado.
A concessionária trava um embate com a agência e com o TCU em torno de um aditivo contratual para a construção de uma nova pista para o acesso a Petrópolis (RJ). A 5ª Vara Federal de Brasília determinou que a ANTT não altere a “condição econômico-financeira vigente” e se abstenha de impor “iminente redução [tarifária]” ou penalidades administrativas.
A área técnica do TCU, em relatório sobre os estudos de transferência à iniciativa privada da BR-101 em Santa Catarina, faz uma análise da evolução de reajustes desde o início dos contratos nas três etapas já realizadas de concessões federais. Os auditores concluem que, em todas elas, a variação acumulada das tarifas ultrapassa os índices de inflação.
Em alguns casos, o aumento de pedágio representa o dobro da alta de preços. Para os técnicos do órgão de controle, isso ocorre principalmente em função de termos aditivos que adicionam obras e serviços às condições originais.