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Recuperação econômica deve ficar para 2020

por | abr 22, 2019 | Outros

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A recuperação econômica do Brasil só deverá ser sentida a partir de meados de 2020, após a aprovação da reforma da Previdência, caso essa aprovação ocorra. O otimismo do mercado financeiro sobre a atuação do governo Jair Bolsonaro retrocedeu desde o início do ano, especialmente devido à dificuldade de articulação . A análise é do cientista político e consultor da LCA Consultores – Soluções Estratégicas em Economia, Ricardo Ribeiro. Ele falou com a Agência CNT de Notícias após a palestra “100 dias de governo Bolsonaro”, nessa quarta-feira, na sede da CNT em Brasília. Segundo Ricardo Ribeiro, se a aprovação da reforma da Previdência não acontecer, o Brasil poderá voltar a um momento de pré-recessão. Ele apresentou algumas pesquisas de avaliação do presidente Jair Bolsonaro. Em uma delas, feita com o mercado financeiro, a avaliação positiva caiu de 86% para 28%, de janeiro a abril deste ano. “Isso demonstra certa decepção com as ações do novo presidente. A desconfiança sobre a capacidade do governo conseguir aprovar, no Congresso Nacional, uma reforma da Previdência relevante indica essa avaliação do mercado financeiro. Também piorou muito a avaliação feita pela população e pela classe política”. O governo do presidente Jair Bolsonaro tem dito que a aprovação da reforma deve gerar uma economia de R$ 1 trilhão em dez anos. Entretanto, as projeções de Ricardo Ribeiro são menos otimistas. Ele estima que o valor fique em torno de R$ 500 milhões ou R$ 600 milhões. Leia a entrevista abaixo:

 

Qual é a sua expectativa para a recuperação econômica do Brasil? Os eleitores do presidente Jair Bolsonaro são otimistas sobre o desempenho dele em relação à economia. Depois de 100 dias de governo, o que o senhor diria sobre isso?

Acho que, em geral, a expectativa positiva prevalece, mas houve um retrocesso em relação ao otimismo que se estabeleceu logo depois da eleição e o otimismo do início deste ano. Isso devido às dificuldades, que são evidentes e acompanham a situação econômica e política do país, da relação entre o Congresso Nacional e o presidente Jair Bolsonaro. Esse é o fator fundamental que está contaminando as expectativas dos agentes econômicos e provocando um retrocesso do otimismo.

Em quanto tempo vamos perceber a recuperação econômica do Brasil? Ela está vinculada à aprovação da reforma da Previdência?

Está muito vinculada. Se a reforma da Previdência não for aprovada, ao contrário da aposta predominante (que é a minha também) de que haverá a aprovação, mesmo que a proposta seja diluída, algo moderadamente relevante irá se estabelecer. Se essa expectativa se frustrar, realmente há um grande risco de voltarmos a uma pré-recessão. Não chegaremos ao nível da crise de 2015 e 2016. Mas, certamente, a atividade econômica vai sofrer bastante.

O senhor acha que a aprovação acontece neste ano?

Ainda estou com esse cenário, apostando até o final do ano. A tramitação está sendo mais tumultuada e mais lenta do que estava se desenhando no início do ano. Mas acho que os próprios parlamentares têm a avaliação de que se não aprovar neste ano, ano que vem é ano eleitoral. Não haverá eleições nacionais, mas as eleições municipais são importantes. Então, é melhor resolver essa agenda neste ano. Se passar para o ano que vem, vai complicar bastante. O cenário de crise pode ganhar mais concretude e atrapalhar a vida de muita gente.

De qualquer forma, podemos dizer que essa expectativa de melhoria da economia acaba mesmo sendo adiada para 2020?

De fato, a ideia de uma recuperação mais sólida, mais relevante da economia, foi sim postergada para 2020.

Por que a recuperação econômica do Brasil está tão associada à reforma da Previdência? Ela é o único caminho? Não há outros caminhos que deveriam ser priorizados pelo governo, paralelamente, para se retomar o crescimento?

A reforma da Previdência é fundamental, apesar do fato de que ela não terá um impacto fiscal fulminante no curto prazo. É uma reforma que vai provocar ganho fiscal ao longo do tempo. Por isso, se fala do impacto em dez anos. O impacto em um ano é pequeno. As consequências fiscais da reforma vão se acumulando ao longo do tempo. Apesar de fiscalmente não resolver de imediato a situação, ela cria uma trajetória fiscal muito mais sólida para o país. É uma trajetória de equilíbrio de recursos. Isso é importante porque a dívida pública do país está em uma trajetória de crescimento. Há um consenso entre os analistas econômicos de que se a dívida pública continuar subindo no ritmo que está subindo, isso vai apontar para uma crise fiscal mais aguda ainda. Crises fiscais muito agudas costumam gerar inflação, desarranjo econômico. No limite, há o risco de uma inadimplência do setor público, de desarranjo dos serviços públicos, como o que ocorre no Rio de Janeiro e em Minas Gerais. Indo um pouco além, há a possiblidade de um calote na dívida pública. Isso afetaria a maior parte dos poupadores do país e atrapalharia muito a imagem do Brasil junto ao mercado financeiro internacional.

 

Paralelamente, não há outras medidas que o governo poderia estar priorizando agora, uma vez que a reforma fica adiada?

Infelizmente não. Esse é um outro problema que terá que ser atacado mais adiante, e o ministro Paulo Guedes tem falado bastante disso. O orçamento público é muito enrijecido, não só da União, mas dos estados e municípios. Sobra pouco do orçamento, depois que paga aposentadoria, salário e outras despesas obrigatórias. Sobra pouco para investimentos, melhoria dos serviços, educação, saúde. A parcela fundamental dessa despesa é com aposentadoria. Essa parcela está crescendo de forma mais acentuada, mais veloz e está apertando cada vez mais o orçamento público. Então, precisa resolver o problema da Previdência. Senão, não resolve o problema fiscal do país.

Como o senhor enxerga o setor de transporte nesse cenário de recuperação econômica? Os investimentos em infraestrutura podem contribuir?

É um setor conectado à situação da economia em geral. No caso dos investimentos em infraestrutura, há um caminho, não necessariamente acoplado a gastos públicos, que é o caminho das concessões. Do ponto de vista do setor de transporte, essa é uma alternativa. Como a capacidade de investimento do setor público está muito diminuta hoje em dia, contar com investimento privado é a saída. O investimento em concessões está ocorrendo e boa parte dessa agenda não depende muito do Congresso Nacional. É só uma decisão do Executivo, de atuar de maneira competente nessa direção. Certamente, é um caminho. Já vem ocorrendo há um tempo, e a tendência é se acentuar ainda mais nesse governo.

O senhor apresentou dados de pesquisas que mostram a desaprovação do presidente Jair Bolsonaro em vários segmentos. De que forma isso impacta a recuperação dos investimentos que o Brasil precisa?

Em termos dos agentes econômicos tomarem decisão de investir ou mesmo de consumir, acho que isso não é tão importante. Mas há um elemento que complica a equação da relação do governo e do Congresso. Um presidente impopular tem menos força de negociação com o Congresso. Há esse impacto em decorrência do enfraquecimento da capacidade de ação política do presidente.

Essa questão da falta de articulação política aliada à dificuldade de aprovação do presidente Jair Bolsonaro em vários cenários, afasta os investimentos que o Brasil precisa? Abala a percepção dos investidores internacionais e nacionais sobre segurança jurídica, sobre a avaliação se o Brasil é um país confiável para se investir?

 

Sim. Não é por acaso que os investidores estrangeiros estão aguardando o desenrolar dos acontecimentos. Estão acompanhando como a reforma da Previdência vai evoluir e o próprio ambiente institucional do país. Por enquanto, o investidor externo está ficando um pouco afastado diante desse quadro. Em outros momentos, já se criou uma expectativa favorável de aprovação da reforma da Previdência, que não se vingou. Foi no governo Temer, e não passou por razões diferentes das atuais. Então, o investidor externo está esperando. Está ressabiado. Está aguardando o que vai acontecer.

A reforma tributária também tem um peso grande nesse cenário de recuperação? Há quem defenda que ela deveria ser aprovada antes da Previdência?

Ela é muito importante porque vai facilitar a recuperação. A ideia é simplificação, é dar maior racionalidade ao sistema tributário. Há uma opinião predominante de que o sistema tributário brasileiro é muito confuso. Tem muitas deficiências que precisam ser corrigidas. Mas a Previdência vem primeiro porque se não resolver o buraco fiscal, não dá nem para mexer. A situação econômica não favoreceria uma reforma tributária. Acho que o timing é correto. Primeiro a Previdência e depois tributária.

Na sua opinião, qual o erro o presidente Jair Bolsonaro não pode cometer para que ele consiga terminar o governo e atender às expectativas de quem votou nele?

Em primeiro lugar, ele não pode tomar decisões que se choquem com a agenda econômica do ministro Paulo Guedes. O ministro Paulo Guedes é um pilar fundamental do governo. Se, por acaso, houver rompimento entre o presidente e ele, seria péssimo para a imagem do governo perante o mercado financeiro, perante os empresários etc. O presidente e o ministro precisam estar bem alinhados. Por isso, preocupou bastante a decisão do presidente de bloquear, impedir a Petrobras de aplicar o reajuste do diesel. Porque essa é uma decisão contrária às ideias mais liberais do Paulo Guedes. Esse seria o pecado fundamental. Mas também tem que cuidar melhor dessa parte da articulação política. Nessa área, as coisas não estão funcionando e precisam ser consertadas.

Reportagem: Cynthia Castro