Pesquisas mostram que os males psicológicos impostos pela pandemia não serão eliminados com facilidade, nem tão rapidamente
A pandemia da Covid-19 deixará milhões de pessoas com sequelas, como problemas respiratórios, neurológicos, musculares e de outros tipos, por períodos ainda desconhecidos de tempo. Algumas dessas sequelas podem desaparecer em semanas; outras podem perdurar por toda a vida. O mesmo vale para as consequências mentais causadas pelo longo período de isolamento: fobias, depressão, ansiedade, estresse e inúmeras outras. Mas, por ainda estarem cercadas de polêmicas e preconceitos, estigmatizam quem delas sofre e, por isso, nelas pouco se fala. O mês de setembro, então, é a ocasião para falarmos desses problemas – que, ainda que agravados pela pandemia, em muito a ultrapassam.
A Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) e o Conselho Federal de Medicina (CFM) criaram a campanha Setembro Amarelo em 2014, para dar ênfase à necessidade de se prestar a devida atenção à saúde mental – e é inspirada no 10 de Setembro, data estabelecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para marcar a prevenção ao suicídio. A conscientização acerca da saúde mental é a maneira mais eficiente e produtiva de se evitar que as tensões e os problemas que afligem a todos nós se avolumem a ponto de levar a atitudes extremas.
Uma pesquisa publicada no último dia 10 no periódico especializado The Lancet Regional Health mostrou que, nos EUA, 42% de um grupo de mais de 2.300 pacientes apresentou algum sofrimento psicológico leve na pandemia em 2020, contra 32% em 2018 (antes da pandemia, portanto), e 10% tinham alguma ansiedade ou depressão moderada a grave. Um outro levantamento – que faz uma revisão de 29 pesquisas, publicada no periódico JAMA Pediatrics – mostrou que sintomas depressivos eram comuns a 12,9% de um grupo de 80 mil jovens com 18 anos ou menos de diversos países antes da pandemia. Com a chegada do novo coronavírus, essa proporção subiu para 25,2%.
Os dados mostram que os males psicológicos impostos pela pandemia não serão eliminados com facilidade, nem tão rápido. Isso fica exemplificado pela pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) publicada também pela The Lancet Regional Health: no Brasil, as consultas relacionadas à saúde mental durante a pandemia caíram 28% – o que representa aproximadamente 470 mil consultas que não aconteceram. Os indicadores são baseados em dados do DataSUS.
As informações referentes aos casos de pessoas que tiram a própria vida são alarmantes: em junho, a OMS publicou o relatório Suicide Worldwide, no qual registrou que mais de 700 mil pessoas morreram por suicídio em 2019 (antes, portanto, da pandemia). Isso representa uma a cada 100 mortes; no Brasil, são aproximadamente 13 mil casos por ano – a maior parte relacionada a distúrbios como depressão e transtorno bipolar.
Setembro Amarelo deve tocar a nossa consciência de que saúde mental não é uma questão acessória. Muito ao contrário: é de extrema seriedade, e não se pode deixar para depois o cuidado de pessoas por problemas mentais. O isolamento prolongado devido à pandemia, o medo de contágio, de sintomas graves e mesmo de morte por Covid-19, de perder o emprego, a pressão gerada pela falta do convívio social – tudo isso (e a lista não acaba aí) são fatores que levam a desgastes psicológicos, que progridem e se tornam doenças mais sérias.
A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) alerta que pequenas mudanças de comportamento podem ser indícios de sintomas de um quadro mais grave. Como em praticamente toda doença, diagnóstico precoce, tratamento e acompanhamento são fundamentais. Assim como é crucial procurar ajuda. A campanha Setembro Amarelo reforça a necessidade de cuidar da saúde mental, e isso é necessário em qualquer época do ano. E para quem sente que a carga de problemas trazida pela pandemia se torna pesada demais, lembre-se: a pandemia vai passar e você não está sozinho. Procure ajuda.